22.4.06

Meu desajeito - Paulo Sant'ana

Paulo Sant'ana
22/04/2006
<<<<<<<<<< Escreví o último parágrafo >>>>>>>>>>>

Meu desajeito

Sou uma pessoa muito complicada na habilidade manual. Ou melhor, não tenho nenhuma. Só depois de completar 20 anos é que consegui dar um laço nos cadarços dos sapatos. E com 35 anos de idade é que cheguei à façanha de dar um nó na gravata. Até lá, os outros é que davam para mim.

Adoro cachorro-quente, mas esse lanche se transforma em verdadeira tortura para mim quando a atendente da lancheria me alcança um sachê de mostarda, esses envelopes de plástico que servem de bisnaga.

Não consigo nunca abrir o sachê, já perdi até certa vez um dente tentando rasgar o plástico que guarda a ansiosa mostarda.

Por isso apelo para a faca, mas nada. Não há como cortar aquele pesponto indicativo da abertura do sachê com faca, sem perigo de cortar-se. Por várias vezes me feri tentando passar a faca na garganta do sachê. Fui tratar do ferimento e adeus cachorro-quente, não há nada pior na vida do que comer sofrendo.

* * *

Claro que há certas embalagens que são facilmente rompidas quando se tem uma tesoura por perto, tanto o caso do sachê da mostarda quanto essas caixas de papelão que trazem leite.

Mas como carregar uma tesoura no bolso ou como encontrar a tesoura em casa quando se quer abrir a caixa de leite?

E se vou cortar o papelão da caixa com a faca, sempre acontece que derramo leite por todo o chão.

* * *

Sendo assim, sou obrigado a renunciar a certos prazeres justamente por essa desastrada inabilidade manual, que é uma marca da minha personalidade.

Uma fruta que acho deliciosa, o abacaxi, nunca mais comi, tanto por não saber descascá-lo como porque quando apelei para a compota não tive a capacidade de abrir a lata.

* * *

Um dia vi no Animal Planet macacos africanos comendo nozes. Eles botavam uma pedra no chão, que lhes servia de plataforma, colocavam a noz em cima e com outra pedra partiam a fruta e a comiam.

Eu sempre achei que as nozes são frutas das mais saborosas, mas nunca intentei abri-las. O mesmo se dá comigo com os pinhões. Se alguém tiver alguma técnica para descascar essas sementes que me mande dizer, pode ser que eu consiga agora no fim da vida passar um inverno comendo pinhões saborosos. Até esta quadra da existência, nunca consegui descascá-los.

Um pinhão para mim é uma geringonça inextricável como para um leão deve ser uma tartaruga que encolha sua cabeça para dentro do casco.

* * *

Mas, sobre a dificuldade de desembaraçar certos produtos de suas embalagens, o leitor Paulo Roberto Heuser manda-me um relato proverbial: "Alguns produtos eletrônicos, apesar de bem visíveis no interior de embalagens transparentes, oferecem extrema resistência a quem tenta retirá-los delas. Embalagens de escovas dentais elétricas, por exemplo, desafiam a imaginação do usuário. Entendo até que os fabricantes tentem evitar eventual test drive das escovas. Aparentemente nenhuma ferramenta foi inventada ainda para abrir as ditas embalagens, formadas por duas placas de material plástico transparente fundidas sobre os produtos. Tentativas frustradas de abertura, utilizando tesouras, facas, alicates e serras, geralmente não produzem outro resultado senão ferimentos nas mãos daquele ou daquela que tenta, já que tudo parece escorregar naquilo. Os habitantes da cidade alemã de Solingen desviam do assunto. Um poste coberto com o material daquelas embalagens daria o pau-de-sebo universal, impossível de ser escalado. O sonho de qualquer festeiro de São João, nunca precisaria distribuir prendas. Após anos de experiência e inúmeras cicatrizes, desenvolvi uma técnica que tem dado bons resultados e poucos ferimentos: inicialmente furo a borda da embalagem utilizando prego e martelo, tomando muito cuidado para que o prego não escorregue, o que só se consegue quando ele está a exatos 90 graus com a superfície. A seguir, utilizo uma furadeira elétrica (sem impacto, pelo amor de Deus!) para ampliar o furo, repetindo o processo, com brocas de diâmetros crescentes, até obter um orifício de 10mm ou 12mm aproximadamente. Nesse momento, com uma serra tico-tico, corto o invólucro até a borda, sem maiores riscos. Nunca caia em tentação e tente substituir a serra por uma faca de serrinha, do tipo para churrasco! É ferimento na certa! A partir daí, a coisa fica simples. Prendo uma das bordas, que se soltou, numa morsa (não meninas, não é um animal) de bancada e rompo a solda do invólucro com uma ferramenta grande, atuando como alavanca. Pode-se utilizar um pé-de-cabra ou uma picareta. Exige um pouco de força, vale pedir a ajuda de vizinhos ou do zelador, se este não tiver hérnia de disco. Quase tão simples como abrir um coco".


psantana.colunistas@zerohora.com.br

4 Comments:

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