13.12.09

570 - Lady Ga Ga e eu



Cosette
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Lady Ga Ga e eu



Paulo Heuser




Eis-me aqui, de pernas para o ar. Tento entender o que, afinal, aconteceu. Vou além e tento achar um culpado. Candidatos não me faltam. Já os tenho no rol de suspeitos: Victor Hugo, Delfim Netto, Dr. Kenneth Cooper, Lady Ga Ga, Johann Wolfgang von Goethe e eu. O fato é que o aquecimento global vinha afetando minhas caminhadas. Sábado, por exemplo, comecei a caminhar e o céu veio abaixo. Caminhada frustrada. Nos dias anteriores, então, não houve condições nem para uma tentativa. Toda história tem que ter um início, e esta não haveria de ser diferente. Um observador apressado poderia concluir que ela iniciou hoje. Ledo engano. No entanto, para uma melhor compreensão dos fatos, deixemo-nos levar por esse engano. Pensando assim, tudo se iniciou hoje, neste belo domingo de sol, coisa rara nos dias de hoje. Dia para se saltar da cama e correr, no sentido figurado, para a rua. Foi o que fiz. Dezoito graus no termômetro incitavam à caminhada vigorosa e entusiástica. Lá fui eu. Caminhei um tanto, até que o chão sumiu sob meus pés. Coisa de filme de Stephen King. Não, não é o Stephen Kanitz. O primeiro escreve histórias de terror comum, o segundo escreve histórias de terror econômico.


A sensação de não haver mais chão é um misto de espanto e impotência. Você está caminhando sob o sol da primavera, o vento traz o frescor do escapamento dos carros e o próximo passo é no nada. Simples assim, nada. Pisei numa tampa de bueiro, de cimento, e ela girou, abrindo um buraco por onde minha perna direita penetrou. Sem apoio, caí sobre o joelho esquerdo, enquanto a perna direita ficava entalada no buraco. Um passante me socorreu e retirou a tampa que prendia a perna. Livre da arapuca, fiz um breve inventário dos danos. O joelho esquerdo estava um tanto danificado, mas é na perna direita que se concentravam múltiplas escoriações feitas por uma espécie de ralador gigante de legumes.


A sabedoria popular é de grande valia, nessas horas. Um advogado apressou-se em me passar seu cartão de visita. Outro passante recomendou que eu ficasse lá e chamasse a imprensa. Um ciclista, completamente equipado, deu-me minuciosas instruções de como fechar novamente a tampa do bueiro, utilizando uma corda e pedaços de madeira. Ajudou-me muito. Por via das dúvidas tomei uma antitetânica e tratei dos estragos.


Agora, mais calmo, começo a perceber o que efetivamente aconteceu. Victor Hugo, o escritor francês, que não fabricava bolsas, escreveu Les Misérables. Pois bem, esses miseráveis fugiram da França e vieram atrás do milagre brasileiro do Delfim Netto. Enganados, não tiveram opção senão furtar as tampas de bueiros feitas de metal. A prefeitura cansou de repô-las e as fez de cimento. O Dr. Kenneth Cooper inventou essa moda de se fazer exercícios físicos, que seriam ótimos para o coração. Talvez, porém, para as pernas, não sei. Eu não fazia idéia de quem seria essa Lady Ga Ga, até que a vizinha veio pedir o CD emprestado, logo após lavarem minhas pernas. Dizem que eu a imitei perfeitamente, gritando gá, gá, a cada esfregada. Goethe entrou de gaiato, pois caí na avenida que levou seu nome. E eu, bem, eu acreditei neles!






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1 Comments:

At terça-feira, 15 dezembro, 2009, Blogger José Elesbán said...

Mas que fase, hein? Mas vai passar!

 

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