A casa do Nestor
Foto: Paulo Heuser
A casa do Nestor
Por Paulo Heuser
Na Praça da Alfândega ocorre um novo tipo de adoção da coisa pública pela iniciativa privada, provavelmente motivada pelas placas que oferecem áreas à adoção. Alguns usuários da praça usam a coisa pública como privada, literalmente. Uma das áreas já foi adotada pelo Nestor. Ele foi membro do MSP – Movimento dos Sem Praça – e pedia esmolas ao lado da loja do mel. Hoje, graças à adoção, Nestor já tem seu cantinho, junto ao monumento a só Deus sabe quem. Deus e o Nestor, pois o local foi cercado e tornou-se impossível ler o que restou da placa na base do busto. Nestor foi chegando, como quem não quer nada, e ficou. Montou a cama e organizou a cozinha. Tudo ao ar livre. Quem tem casa, quer casar, reza uma variante do célebre ditado. Logo uma moça interessou-se pelo Nestor e formaram um par. Hoje estão lá, felizes, pois o quintal é grande. Quem sabe, poderão até plantar uma horta?
Por Paulo Heuser
Na Praça da Alfândega ocorre um novo tipo de adoção da coisa pública pela iniciativa privada, provavelmente motivada pelas placas que oferecem áreas à adoção. Alguns usuários da praça usam a coisa pública como privada, literalmente. Uma das áreas já foi adotada pelo Nestor. Ele foi membro do MSP – Movimento dos Sem Praça – e pedia esmolas ao lado da loja do mel. Hoje, graças à adoção, Nestor já tem seu cantinho, junto ao monumento a só Deus sabe quem. Deus e o Nestor, pois o local foi cercado e tornou-se impossível ler o que restou da placa na base do busto. Nestor foi chegando, como quem não quer nada, e ficou. Montou a cama e organizou a cozinha. Tudo ao ar livre. Quem tem casa, quer casar, reza uma variante do célebre ditado. Logo uma moça interessou-se pelo Nestor e formaram um par. Hoje estão lá, felizes, pois o quintal é grande. Quem sabe, poderão até plantar uma horta?
O Nestor já conta com telefone. Há um orelhão próximo da sua nova morada. Ontem o telefone tocou. Nestor apressou-se em atender, pois poderia se tratar de algo urgente.
- Alô?
- Boa tarde! Eu gostaria de falar com o Seu Nestor.
- É ele!
- Como vai o senhor?
- Não tenho queixa enquanto não chover.
- Pois então, Seu Nestor. Sou consultora do Banco Basco, em nome de quem gostaria lhe fazer uma oferta.
- Quer me dar dinheiro?
- Pois então, Seu Nestor, nós poderíamos estar conferindo algumas informações, por segurança?
- Sim, se é para me dar dinheiro, pode mandar...
- Pois então, Seu Nestor, seu endereço é Praça da Alfândega. E o número, qual seria?
- É no lado do monumento do Tiozão, aquele que fica perto daquela mulher gorda. Não tem número. É só perguntar para as moças aqui ao lado, elas sabem.
- São secretárias?
- Bem, não é bem isso, mas elas sabem.
- O senhor é casado, Seu Nestor?
- Hoje sou, tem a Fulana, que se chegou por aqui...
- E o nome dela seria?
- Sei lá o nome dela, chamo de Fulana. Nos juntamos os trapos há apenas uma semana.
- Pois então, Seu Nestor. O Banco Basco estará lhe fazendo uma proposta...
- Se é dinheiro, manda.
- Pois então, Seu Nestor. O Banco Basco estará lhe oferecendo um seguro residencial com título de capitalização premiado. Três produtos em um só!
- Droga, se eu tivesse casa, não moraria na praça!
- Pois então, Seu Nestor. O senhor mencionou que estaria morando junto a um monumento.
- Sim, e daí?
- O senhor não estaria interessado no nosso Seguro Patrimonial Histórico-Cultural com título de capitalização premiado?
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Marcadores: adoção de praças, monumentos, Praça da Alfândega
1 Comments:
estamos quase chegando nesse ponto!
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