3.3.09

506 - De gases e pílulas


Foto: Wikipedia
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De gases e pílulas

Por Paulo Heuser


Vim a Porto Alegre, em março de 1973, para estudar no Colégio Farroupilha. Estava concluindo o Científico – designação de então do atual Ensino Médio. Após muitos anos de Colégio Mauá, de Santa Cruz do Sul, senti-me como um peixe fora d’água. Tudo era novo e estranho. Contudo, contrariando minhas primeiras expectativas, fiz algumas amizades logo nos primeiros dias de aula. Como era o último ano na escola de todos naquela turma, os mais marotos pensavam em traquinagens de despedida. A guerra de bexigas d’água já era tradição e dispensava grandes planejamentos. Havia de ser algo diferente e de impacto. O Nelson pensou em produzir gás sulfídrico (H2S), conhecido popularmente como “peido engarrafado”. O enxofre garante um terrível fedor de ovo podre. Ocorre que a turma encontrou dificuldade para adquirir as substâncias que levariam à produção do gás. Era tempo da Revolução, e qualquer coisa mais complexa que o ar era considerado suspeito.

Aluno novo, desejoso de me enturmar, contei-lhes sobre um evento ocorrido em 1972, no Colégio Mauá. Um dos alunos internos havia trazido um medicamento fitoterápico denominado Bálsamo Allemão – com dois eles, para ser bem alemão. Tal substância era produzida a partir da planta Kalanchoe tubiflora, que apresentava características de odor e sabor extremamente peculiares. Como todo medicamento fitoterápico que se prezava, tinha gosto pavorosamente amargo e cheiro insuportável. Remédio bom tem de ser amargo e fedorento. E o Bálsamo Allemão era um ótimo remédio, o que indicava que ele era muito amargo e fedia muito. Quem era do Interior, sabia. Antes que eu me esqueça, aquilo curava qualquer pereba. Um aluno da turma espalhou o conteúdo do pequeno frasco entre as tábuas do piso. Bem que tentaram dar aula lá dentro. Foi impossível.

Meus novos colegas acharam a história muito interessante e saíram a campo. Encontraram o Bálsamo Allemão em uma farmácia lá pelo Caminho do Meio. Quando o balconista viu aquela trupe com cara de cidade grande pedir o Bálsamo logo disse:

- Vocês vão aprontar alguma!

- É para o meu avô – disse Marco, com cara de anjo do Apocalipse.

O Biba encarregou-se de espalhar a coisa entre as frestas dos tacos do piso. Repetiu-se na Capital o que ocorrera no Interior. A sala de aula ficou imprestável. O professor Rasia ainda tentou dar aula, mas também sucumbiu à pestilência fitoterápica. O professor de Física foi derrotado pela Botânica. A propósito: crianças, não copiem! Fede muito!

Li a seção de Ciência e Saúde da Folha de São Paulo de hoje. Novamente a ciência me surpreendeu com uma descoberta fantástica: o gás sulfídrico apresenta resultados semelhantes ao do Viagra, quando administrado aos portadores de disfunção erétil. O que mais me espanta, mesmo, é que alguém testou um negócio desses. Masoquistas radicais: essa é a sua deixa. A operacionalização da coisa deve ser curiosíssima. Em vez de tomar pílulas azuis o sujeito fica a inalar peido engarrafado.

Será que os alunos ralarão pílulas azuis para esfregá-las entre as tábuas do piso?

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1 Comments:

At quarta-feira, 20 janeiro, 2010, Anonymous Anônimo said...

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