Candidatos
Publicada em 03/06/2006 no jornal Gazeta do Sul, de Santa Cruz do Sul, coluna Opinião:
http://www.gazetadosul.com.br/default.php?arquivo=_noticia.php&intIdConteudo=55087&intIdEdicao=866
http://www.gazetadosul.com.br/default.php?arquivo=_noticia.php&intIdConteudo=55087&intIdEdicao=866
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Publicada no Portal Sulmix em 12/07/2006:
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http://www.sulmix.com.br/principal_politica/PAGINAS/politica1129.htm
Candidatos
Não sei o que estou fazendo, aqui sentado, aguardando para votar. Já sofri tantas desilusões pós-eleitorais que não tenho mais prazer em votar. Aquela maravilha de candidato, eleito, cai na mesmice do anterior. Há vários tipos de candidatos, os coitadinhos, os varredores, os intelectuais, os empreendedores, os operários ou camponeses, os bons-meninos e os perus. Os primeiros, os coitadinhos, são sujeitos realmente preocupados com o bem estar dos outros. Tem idéias que poderão nos tirar desta situação calamitosa em pouco tempo. Batalham dia e noite em prol da comunidade. Levam gente ao médico, tratam sarna de cachorro, fazem campanha para comprar perna mecânica, até assumirem o cargo eletivo. Aí descobrem que existem leis que não permitem que se faça o bem comum, sem a obediência de certos preceitos jurídicos e procedimentos formais. Afogam-se no mar da burocracia, pela própria simplicidade. Como sua equipe de trabalho, por vezes, não é tão inocente assim, acabam se enredando em auditorias e sindicâncias. A renúncia é uma saída a considerar, para fugir de processos mais rigorosos de apuração dos desvios cometidos, em seu nome. Os varredores são os candidatos que prometem varrer a sujeira da administração, denunciam irregularidades, prometem punições, exonerações e austeridade total. Seu discurso é forte, incisivo e raivoso. Batem com a mão, ou o sapato, na mesa, enquanto prometem arrasar os funcionários julgados ineficientes. Uma vez eleitos, adotam uma ou outra medida de impacto, demitem um ou dois servidores, como exemplo, vivendo uma administração morna, movida a factóides ocasionais, até que um dos varridos resolva tirar a sujeira de debaixo do tapete. A renúncia e a destituição são caminhos naturais para os varredores. São potenciais candidatos ao retorno, pautando suas campanhas no papel de vítimas da intriga política. Os intelectuais são aqueles que julgam situar-se acima da capacidade de compreensão dos eleitores, estes não intelectuais, desprezíveis males necessários. Os intelectuais modernos são vítimas da especialização do trabalho. Na antiguidade, intelectual era um estudioso da ciência, não de apenas um ramo de uma das ciências. A extrema especialização, decorrente da divisão do trabalho, produz sumidades em áreas muito específicas do conhecimento humano, enquanto se apresentam completamente alienados em muitas outras. Os bons são os que conhecem o tamanho da própria ignorância e delegam, a quem sabe, aquilo que ignoram. Infelizmente, os delegados nem sempre fazem jus à confiança neles depositada. Intelectuais tendem a chegar ao fim de suas administrações, mais pela falta de escândalos, que os derrubem, do que pelas qualidades administrativas. Empreendedores são tipos potencialmente perigosos quando não há orçamento folgado. Precisam desesperadamente de obras, úteis ou inúteis. Tem de estar sempre ocupados com novos projetos. Há os empreendedores setoriais, aficionados por algum tipo de empreendimento. Lembro de um candidato, que já havia sido presidente de um clube social. Fanático por banheiros, em cada canto via uma oportunidade para instalar algum. Ganhou o Prêmio de Higienizador do Ano, com direito a coquetel, discursos e um troféu em forma de vaso sanitário estilizado. Outros têm fixação por espelhos, placas comemorativas e inaugurações de qualquer coisa inaugurável. Fazem o estilo “realizar primeiro, planejar depois”. Contratam consultorias que lhes permitem receber prêmios de gestão. Os eleitores gostam. Os operários e camponeses são raivosos durante a campanha e emotivos após a eleição. Eleitos, choram e culpam “as elites” por tudo o que ocorre de errado, enquanto guiados por algum tipo de elite. Os operários e camponeses orgulham-se da origem humilde, das mãos calejadas, da falta de cultura e dos modos rudes. Eleitos, circulam em caminhonetes caras (para visitar as bases) e trocam o visual rústico pelo Armani. Acabam descontentando tanto aos eleitores, que os conduziram ao poder, como aos outros, seja quem for. Bons-meninos fazem o tipo educado, ponderado, mantendo a fleuma, durante o jogo de golfe, enquanto o campo é bombardeado. Adoram enaltecer as virtudes do vinho nacional, entre goles de um Château Petrus 1976. Não polarizam, são corretos, medianos e insossos demais. Em nome da política, em decorrência da campanha, amizades se desfazem, famílias se dividem, vizinhos deixam de se cumprimentar. Continuo desconfortável. Desde que não votem em mim, tudo bem. São 20h30 e o presidente da mesa anuncia o início da assembléia, para eleição do novo síndico. Esqueci dos perus? Bem, os perus são os candidatos que não decolam, mas fazem muita sujeira e barulho, na tentativa.
Paulo Roberto Heuser
Candidatos
Não sei o que estou fazendo, aqui sentado, aguardando para votar. Já sofri tantas desilusões pós-eleitorais que não tenho mais prazer em votar. Aquela maravilha de candidato, eleito, cai na mesmice do anterior. Há vários tipos de candidatos, os coitadinhos, os varredores, os intelectuais, os empreendedores, os operários ou camponeses, os bons-meninos e os perus. Os primeiros, os coitadinhos, são sujeitos realmente preocupados com o bem estar dos outros. Tem idéias que poderão nos tirar desta situação calamitosa em pouco tempo. Batalham dia e noite em prol da comunidade. Levam gente ao médico, tratam sarna de cachorro, fazem campanha para comprar perna mecânica, até assumirem o cargo eletivo. Aí descobrem que existem leis que não permitem que se faça o bem comum, sem a obediência de certos preceitos jurídicos e procedimentos formais. Afogam-se no mar da burocracia, pela própria simplicidade. Como sua equipe de trabalho, por vezes, não é tão inocente assim, acabam se enredando em auditorias e sindicâncias. A renúncia é uma saída a considerar, para fugir de processos mais rigorosos de apuração dos desvios cometidos, em seu nome. Os varredores são os candidatos que prometem varrer a sujeira da administração, denunciam irregularidades, prometem punições, exonerações e austeridade total. Seu discurso é forte, incisivo e raivoso. Batem com a mão, ou o sapato, na mesa, enquanto prometem arrasar os funcionários julgados ineficientes. Uma vez eleitos, adotam uma ou outra medida de impacto, demitem um ou dois servidores, como exemplo, vivendo uma administração morna, movida a factóides ocasionais, até que um dos varridos resolva tirar a sujeira de debaixo do tapete. A renúncia e a destituição são caminhos naturais para os varredores. São potenciais candidatos ao retorno, pautando suas campanhas no papel de vítimas da intriga política. Os intelectuais são aqueles que julgam situar-se acima da capacidade de compreensão dos eleitores, estes não intelectuais, desprezíveis males necessários. Os intelectuais modernos são vítimas da especialização do trabalho. Na antiguidade, intelectual era um estudioso da ciência, não de apenas um ramo de uma das ciências. A extrema especialização, decorrente da divisão do trabalho, produz sumidades em áreas muito específicas do conhecimento humano, enquanto se apresentam completamente alienados em muitas outras. Os bons são os que conhecem o tamanho da própria ignorância e delegam, a quem sabe, aquilo que ignoram. Infelizmente, os delegados nem sempre fazem jus à confiança neles depositada. Intelectuais tendem a chegar ao fim de suas administrações, mais pela falta de escândalos, que os derrubem, do que pelas qualidades administrativas. Empreendedores são tipos potencialmente perigosos quando não há orçamento folgado. Precisam desesperadamente de obras, úteis ou inúteis. Tem de estar sempre ocupados com novos projetos. Há os empreendedores setoriais, aficionados por algum tipo de empreendimento. Lembro de um candidato, que já havia sido presidente de um clube social. Fanático por banheiros, em cada canto via uma oportunidade para instalar algum. Ganhou o Prêmio de Higienizador do Ano, com direito a coquetel, discursos e um troféu em forma de vaso sanitário estilizado. Outros têm fixação por espelhos, placas comemorativas e inaugurações de qualquer coisa inaugurável. Fazem o estilo “realizar primeiro, planejar depois”. Contratam consultorias que lhes permitem receber prêmios de gestão. Os eleitores gostam. Os operários e camponeses são raivosos durante a campanha e emotivos após a eleição. Eleitos, choram e culpam “as elites” por tudo o que ocorre de errado, enquanto guiados por algum tipo de elite. Os operários e camponeses orgulham-se da origem humilde, das mãos calejadas, da falta de cultura e dos modos rudes. Eleitos, circulam em caminhonetes caras (para visitar as bases) e trocam o visual rústico pelo Armani. Acabam descontentando tanto aos eleitores, que os conduziram ao poder, como aos outros, seja quem for. Bons-meninos fazem o tipo educado, ponderado, mantendo a fleuma, durante o jogo de golfe, enquanto o campo é bombardeado. Adoram enaltecer as virtudes do vinho nacional, entre goles de um Château Petrus 1976. Não polarizam, são corretos, medianos e insossos demais. Em nome da política, em decorrência da campanha, amizades se desfazem, famílias se dividem, vizinhos deixam de se cumprimentar. Continuo desconfortável. Desde que não votem em mim, tudo bem. São 20h30 e o presidente da mesa anuncia o início da assembléia, para eleição do novo síndico. Esqueci dos perus? Bem, os perus são os candidatos que não decolam, mas fazem muita sujeira e barulho, na tentativa.
Paulo Roberto Heuser
5 Comments:
é verdade.
muito boa a crônica.
juliana.
muito boa a crônica, ainda mais nesse ano!
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