2.1.07

Terneiros Órfãos

Terneiros Órfãos

Por Paulo Heuser

Retrospectivas e perspectivas são a tônica da Passagem de Ano. Descobri que esta deve ser a época de férias coletivas dos jornalistas. Não há nada de novo nas revistas, jornais ou televisão. Tudo é velho, ou presumido. As revistas semanais publicam monótonas e enfadonhas retrospectivas do ano que passou. Pegam alguns estagiários e mandam fazer um apanhado do que foi manchete durante o ano. Depois é só juntar e publicar. Esta é a razão porque não assino revistas semanais. Odeio receber o último número do ano. Já vi tudo que está lá dentro. Sinto-me transportado ao tempo em que se ia ao litoral, fora de época, e não havia nada para ler, senão revistas velhas.

Os jornais de fim de ano também não animam muito. O mundo deixa de existir. Não há nem propagandas lá dentro. As posses dos eleitos até que renderam assunto. Nada de novo lá em cima, onde o velho foi reempossado. Assisti ao desfile da posse de Lula, pela tv. Aquele Rolls-Royce Silver Wraith emprestou um ar solene ao evento, como seria de se esperar. Ar que terminou no pára-choque traseiro da limusine aberta inglesa. O que veio após, foi pelo menos curioso. Por um momento, acreditei que Bob Falfa (Harrison Ford) dirigia aquele roadster, como que saído de American Grafitti (1973), de George Lucas. O Ford 29 formou um estranho par com o imponente Rolls. O Vice-Presidente chegava aos 40, à época do filme. Não entendi por que alugaram um Ford 29, para transportá-lo. Sentiu saudades da juventude?

Na tv aberta, a coisa não muda muito. Notícias que dizem respeito às posses do Presidente e dos Governadores são alternadas com outras que falam das festas, daqui e do mundo. Por volta do meio-dia do dia 31 de dezembro já sabemos como foi a virada dos cangurus. George W. acabou dando notícias, ao enforcar Sadan. Auxiliado por um infeliz que gravou as imagens da execução, no celular, uma prova da infinita capacidade do homem de gerar coisas de mau gosto. Bailes de fim de ano, enlatados antes do fim de ano, são outra opção na tv.

Terminados os assuntos, vêm as previsões. Meio fracas, neste ano. Estes dias são tão fracos em assunto, que transferiram o sorteio da Mega Sena, de quarta-feira, para o domingo, na esperança de aumentar os índices de audiência do Faustão. Para confirmar que não há assunto, ninguém acertou os seis números. Tese confirmada também pelo retorno à normalidade dos vôos no Brasil. Senão, dariam notícia. O contraponto veio da Nigéria, onde um avião caiu, dando notícia. Seguido pela Indonésia.

Quando terminam todos assuntos publicáveis, ou não, os estagiários se dobram para achar notícia, nem que esta seja sobre a comovente adoção de seis terneiros órfãos pela cadela Yorkshire miniatura, que os amamenta.

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