26.2.07

Da Série Faça Você Mesmo - Meu Primeiro Reino

Da Série Faça Você Mesmo – Meu Primeiro Reino

Por Paulo Heuser

Reinos não são eternos, para todos há um início, para alguns, um fim. Há mais de uma forma de se criar um reino. A mais antiga, clássica, consiste em tomar o poder na base da força, da porrada. Reunia-se um exército de conspiradores que derrubava o rei, então investido, escolhendo um novo, já definido durante a conspiração. Este morria antes da coroação, pois era escolhido como boi de piranha, ou ainda como o Bode de Azazel, que, segundo a tradição judaica, recebia todos os pecados do sacerdote e do povo no Dia da Expiação, sendo jogado no deserto. Lá viveria a expiar todos os pecados. Expiar com “x”, no sentido de redimir. Havia também os que espiavam com “s”, para tirar algum proveito disso, depois. Surgia então o novo rei, escolhido pelos neoconspiradores. Havia conspiração dentro da conspiração, criando o círculo monstruoso da Teoria da Conspiração. Será este um fantástico exercício dela?

Todos aqueles que contribuíam de alguma forma para eliminar o rei morto e dar vivas ao novo rei vivo, recebiam título de nobreza. Formavam a corte, os que representavam o colchão entre o rei e a plebe. Absorviam os choques originados na plebe e deixavam passar os originados no rei. Foram os crocodilos de fosso intramuros. Os nobres eram mantidos quietos através de benesses diversas, como terras, escravos, pagamentos em dinheiro, verbas de representação, passagens de carruagem, carruagens off-road, verbas para manutenção do feudo, etc. Não faltaram histórias sobre tesouros na Helvécia e na Normandia insular. Cada nobre controlava um feudo, contratando um enorme exército de defensores, tudo pago pelo caixa do reino. Alguns nobres gastavam demais, tendo de recorrer às contribuições espontâneas de burgueses. Estes, apesar de não ostentarem títulos de nobreza, detinham a maior parte do poder, pois deles vinham os recursos financeiros para a manutenção do poder no reino. Sem eles, o rei estaria nu, e os nobres, desempregados.

Os nobres reuniam-se em câmaras, de onde aparentavam legislar sobre as coisas da plebe. Na prática, concorriam entre si para escolher o mais nobre dos nobres. Eventualmente, quando a plebe e a burguesia inquietavam-se, a corte escolhia um novo Bode de Azazel, atribuindo-lhe todos os pecados e jogando-o no Deserto Paradiso, através da aposentadoria, de onde passava a conspirar nas sombras, através de um processo denominado articulação política.

Um outro grupo de nobres julgava os eventuais deslizes dos pares, utilizando normas criadas pelos julgados. Eventualmente, poderia ocorrer alguma falha constitucional no processo, liberandos réus a rodo. Alguém erroneamente enquadrava os nobres no artigo errado da norma, anulando todo o processo. Quando havia normas demais, o pessoal se confundia.

Com o cair da areia da ampulheta, e de um bocado de cabeças francesas, vieram os novos tempos. Liberdade, fraternidade e igualdade, finalmente. A partir de então, reinos não são mais reinos, são repúblicas. Reis não são mais reis, são presidentes. Nobres não são mais nobres, são parlamentares. Burgueses não são mais burgueses, são empreendedores. A plebe não é mais plebe, é o povo, e “todo o poder emana do povo, que o exerce através de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” - Ex vi do parágrafo único, do art. 1º da Constituição Federal de 1988, a “Constituição Cidadã” (sic).

E-mail: prheuser@gmail.com

1 Comments:

At terça-feira, 27 fevereiro, 2007, Blogger José Elesbán said...

Ah! Eu esperava uma maneira de constituir um reino... :(

 

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