12.2.07

Réquiem Para o Verdinho

Réquiem Para o Verdinho

Por Paulo Heuser

Sexta-feira, 19 horas. O pessoal começa a aparecer para o happy hour na Calçada da Fama. O Verdinho veio junto. Nada mais justo, após um dia mormacento como este. Não se podia chamá-lo de lindo, apesar de ter um certo charme. Fazia sucesso entre os conhecidos que aprenderam a amá-lo. Também não se poderia chamá-lo de jovem, mas apresentava saúde de causar inveja àqueles. Com a cidade ficando vazia, pela peregrinação dos siris em direção à praia, os bares recebiam seus primeiros freqüentadores. O Verdinho chegou cedo, para garantir um bom lugar, coisa fundamental numa noite de sexta.

O destino é assim mesmo. Num segundo se está ali, alegre, cheio de sonhos e esperanças. No segundo seguinte, foi-se. Provavelmente o Verdinho nem chegou a perceber o que o atingiu. Deve ter ouvido o estalo. O prenúncio da queda de um jacarandá podre, como tantos outros que adornam nossas ruas. Após o estalo, o estrondo. E o silêncio. O Verdinho jazia inerte, sob um imenso galho do jacarandá. Outro lhe perfurou as entranhas, pelas costas. Numa típica atitude dele, não gemeu nem reclamou. Apenas aguardou o socorro, quase indiferente à multidão que acorreu ao local da tragédia. Não faltaram os urubus de ocasião, chegando com um estranho brilho nos olhos. Querem ver de perto a desgraça. Chegam excitados, sorridentes, com um estranho brilho no olhar. Chegou também o bêbado solidário. Palavras babadas de indignação contra a Prefeitura emolduravam o olhar turvo de quem já passara para uma hora menos feliz. A hora da ressaca perene. Os garçons e os convivas dos bares trouxeram solidariedade e palavras de conforto. Depois voltaram à hora feliz, pois era sexta-feira, a festa tinha de continuar. Um soldado fazia de tudo para ajudar. Reiterava os pedidos de socorro, pelo rádio, para que o Verdinho pudesse ser retirado dali.

A motosserra correu solta. O imenso galho do jacarandá foi transformado numa imensa pilha de lenha. Ao lado do toco da árvore que tombou inteira no mês passado. Qual será a próxima? Retirados os galhos, pode-se perceber logo que a situação do Verdinho não era boa. Estava coberto de hematomas e escoriações. Contudo, parecia manter a dignidade. Não gritou, não chorou, apenas ficou quieto, como que aguardando o inevitável. O destino lhe pregara aquela peça. Nada mais poderia fazer. Nem eu. Fazer o quê? Não me restou alternativa senão sentar à mesa, em algum lugar na fronteira imaginária entre o Liliput e o Jazz Café, e pedir um chope. A tempo de ver o guincho da seguradora virar a esquina da Padre Chagas, carregando o meu Verdinho nas costas.

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