22.2.07

Prescrições Alternativas

Prescrição Alternativa

Por Paulo Heuser

Entrei na farmácia, trazendo na mão a receita prescrita pelo médico. O nome do remédio estava lá, claramente, em letras incompreensíveis de alguma língua estranha. Diz-se da justiça que utiliza aquele peculiar jargão para impedir os usuários de dispensar os advogados. Assim deve ser na Medicina. Médicos e farmacêuticos estabeleceram um código secreto milenar para identificar as receitas. Esse código é tão secreto que, por vezes, os médicos que prescrevem a receita não entendem a própria letra. Aí vem o livre arbítrio do balconista. Recusa e receita, consulta outro sábio em hieróglifos ou faz sua própria interpretação, entregando o que há de mais semelhante no estoque. Afinal, qual é a diferença entre um Piroxiheptacoximperemterol e um Piroxihexacoximperemterol? E agora lançaram o II – Turbo Advanced, ainda desconhecido pelos médicos. O homem da mala preta ainda não passou pelo consultório.

O sorridente balconista tomou a receita das minhas mãos. A leu atentamente, enquanto falava alguma coisa em voz baixa e gesticulava com a mão esquerda, como que contando unidades. Nesse momento ouvimos uma voz que rugia:

- Não vai adiantar nada!

Era um chato de farmácia, peru de doença dos outros, curandeiro universal de plantão. Ele fica olhando os cosméticos em exposição enquanto aguarda sua presa – qualquer um que traga uma receita nas mãos. A voz rugiu novamente:

- Isso é perda de tempo e dinheiro! – esticou o pescoço para ler a receita, de esguelha.

- Vinagre! Vinagre é a solução! Curei minha candíase com vinagre! – continuou ele.

O balconista não pareceu surpreso, pois o chato deveria ser bem conhecido por lá.

- Mas, a receita é de um colírio... – não consegui terminar a frase.

- Besteira, ponha vinagre! Se for para o olho, amasse alho roxo e misture com o vinagre. Passe quatro vezes ao dia, até que o olho fique bom. Se não enxergar mais, retire o alho. É tiro e queda!

O balconista aguardava minha decisão, olhando de um para o outro. Disse-lhe que levaria o colírio, assim mesmo. O chato sacudiu a cabeça, em desalento, enquanto sentenciava:

- Há um trouxa para cada receita!

- Bem, foi o médico quem receitou...

- Não entende nada! Garanto que ele usava óculos, não é?

- Sim, mas...

- Vai acreditar num médico de olhos que não consegue curar a si mesmo?

Dirigi-me ao caixa, levando o colírio, antes perguntando ao balconista:

- Vocês teriam também vinagre e alho?


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