24.7.07

Desdém com as baratas


Desdém com as baratas

Por Paulo Heuser


Pois eu já vinha estranhando o desempenho das equipes norte-americanas em alguns esportes como a natação, nos Jogos Pan-americanos 2007. Não se trata de nenhum tipo de simpatia. Sei, no entanto, que aqueles que vivem ao norte do Rio Grande (o do Texas) investem um monte de dinheiro, que não lhes falta, no esporte. Deu para estranhar mais quando o treinador da equipe, sei lá do que, deles disse que só competiriam em campo molhado se o COB cobrisse o valor do seguro deles, todos amadores de universidades, já com contrato previsto para a próxima temporada. Coisa pouca, questão de um ou dois milhões de US dólares por cada, sem trocadilhos. Tudo que eles mandaram tinha cheiro de equipe B. Sacanagem. Nos debulhamos em esforços, ganhamos medalhas, e eles confessam agora que mandaram as equipes B. Podemos alegar que o alfabeto deles começa no B, apesar de haver palavras em inglês iniciando com A.

O New York Times e os outros jornais deles sequer cobrem o Pan 2007. Fingem que não existimos. Nem nós, nem os demais cucarachas latino-americanos. Desconhecem até a existência dos chilenos, que, por sinal, também desconhecemos no Pan. E, o que é pior, fingem desconhecer até os argentinos, nossos mais notórios inimigos naturais, excluindo Cuba, naturalmente. Porém, com os cubanos mantemos relações aceitáveis fora do esporte. Os cubanos não vêm veranear em Santa Catarina e não se gabam de fazer um vinho melhor do que o nosso. Tampouco dizem que Bariloche é melhor do que Gramado. Sem mencionar outras pequenas diferenças no futebol. Os cubanos gostam tanto de nós que alguns deles até ficam por aqui, após os jogos.

O que irrita na atitude norte-americana é exatamente a indiferença. Estão aqui, sorriem, competem, mas é como se não estivessem. Cumprem protocolo, apenas. Ganham algumas medalhas, para disfarçar a indiferença. Mais medalhas que os outros, para disfarçar melhor. Pois é hora de lhes dar o troco. Não aqui, no Pan, já que nos ignoram. Daremos o troco no território deles, onde lhes dói mais. Vamos fingir que o Disneyworld não existe. Deixaremos de mandar nossos filhos para lá. Deixaremos de implorar por vistos que levarão dólares para eles. Ficam com o nosso dinheiro e fazem beicinho. Vamos mandá-los ao Beto Carrero e ao Circo Tupã. Custa muito menos e não exigem visto. E, não precisam ir de avião! Nem voltar após horas de vôo, porque o eletricista da selva confundiu o fio verde com o vermelho. Vamos mandá-los até para Bariloche, sem luz e sem gás, para que lembrem como a casa é quentinha. Quem puder, mande-os à Europa. Poderão tomar rengo-cola olhando mulher pelada em Paris. Comerão pizza de verdade na Itália. Onde não lhes exigirão visto. Poderão sair à noite, sem medo. Sem medo de serem confundidos com a equipe B.
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