25.7.07

O fim

A Batalha de Issus
Albrecht Altendorf

O fim

Por Paulo Heuser


Quanto tempo após cessar a respiração ocorre o fim do metabolismo celular? Ou, em outras palavras, o sujeito parte definitivamente desta para a melhor? Depende. De quatro a dez minutos, segundo o artigo publicado na edição eletrônica de 24/07 da Scientific American. Depende da temperatura, do tipo de tecido – não aquele da roupa -, e de outros fatores. Ou seja, não há resposta precisa. É a procura do fim. Muitos dirão que não se trata de um fim, apenas de uma passagem. Poderemos então falar no fim de uma etapa. Um fim, portanto.

Há coisas que procuram um fim, desesperadamente, como as obras que nunca são concluídas. As reformas de banheiros são as piores, por razões que parecem evidentes. Todo mundo que já as enfrentou, sabe que o relógio da obra anda em outro ritmo, bem mais lento. Lá dentro do banheiro o tempo se arrasta de forma imperceptível. Dá para se colocar roupa para secar no ponteiro dos segundos. O Princípio da Incerteza de Werner Karl Heisenberg (1901-1976) se aplica perfeitamente às obras em banheiros. É impossível determinar simultaneamente a posição do vaso sanitário e velocidade dele. Pelo menos de forma instantânea. Fatos científicos, coisas da Mecânica Quântica. Albert Einstein rejeitou as idéias de Heisenberg, durante muito tempo. Dizem que Einstein enfrentou alguns problemas no banheiro, por conta disso, ao não conseguir encontrar o vaso onde esperava, num dado momento de aperto instantâneo. A determinação passa a ser estatística. Existe uma probabilidade de o vaso estar em um local definido. Portanto, não se deve ir procurá-lo na última hora. Em todo caso, provou-se mais cautelosa a aplicação da Mecânica Quântica nas reformas de banheiros. É melhor pensar sempre na pior hipótese, prevendo uma alternativa. Rápida.

Quase todas os eventos devem ter um fim. As festas, por exemplo, devem ter fim, que não precisa necessariamente ser pré-determinado. Alongá-las demasiadamente pode ser um suplício. Como nas festas em que aplicam o Princípio da Incerteza ao garçom. Nunca descobrimos onde ele anda, quando precisamos dele. Em outras, qualquer fim parece prematuro, temos vontade de alongá-las indefinidamente. Lembro-me de algumas. Provavelmente guardo boas lembranças porque tiveram um fim. Festa sem fim é o Carnaval baiano. Não tem fim porque não tem início. Apresenta períodos de latência que não caracterizam início ou fim. O Carnaval anda paralelo ao tempo, ora se aproximando, ora se afastando, mas nunca cruzando com ele. O que deve ter fim, em qualquer festa, é o discurso. Alguns discursos terminam com a festa. Fuja de qualquer festa que homenageie alguém importante. O cordão dos puxa-sacos vai infernizar com os intermináveis discursos encadeados.

Alguns artistas não conseguem terminar suas obras. Que vê O Massacre dos inocentes, de Peter Paul Rubens (1577-1640), é tentado a acreditar que os pintores barrocos eram renascentistas que não sabiam quando terminar suas obras. Sempre havia mais algo a ser pintado, no mesmo quadro. Encomendavam-lhes um retrato de mulher e eles ilustravam a história da humanidade, em apenas uma tela. Pensando bem, até que faz sentido. Porém, nada se compara à Batalha de Issus, de Albrecht Altendorf (1480-1538). Levaram dois anos para completar essas obras. Terminaram porque não havia mais espaço nas telas.

O que dizer dos textos, então. Sei, entendi. É melhor colocar um fim neste.
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