4.7.07

Paris está em chamas?


Paris está em chamas?

Por Paulo Heuser


Paris me emocionou em duas ocasiões. Na primeira, eu era um adolescente, e não estava em Paris. Estava sentado em uma das poltronas estofadas do Cine Victória, em Santa Cruz do Sul. Assistia ao filme “Paris está em chamas?” (Paris Brûle-t-il)(1966), de René Clement, com um fabuloso elenco. Curiosamente, o filme foi rodado em preto e branco. Alguns dizem que essa opção se deveu à proibição da exibição da bandeira nazista, em preto e vermelho, em território francês. O filme conta também com uma inesquecível trilha sonora de Maurice Jarre, e mostra a resistência francesa à ocupação nazista, culminando com a libertação de Paris, em 28 de agosto de 1944. Os filmes de guerra não costumam emocionar, pelo menos com as emoções corretas, mas esse em especial emocionou. Graças ao general alemão Dietrich Von Choltitz (Gert Fröbe), os monumentos de Paris foram poupados da destruição. Ele assumiu o comando militar de Paris em 9 de agosto de 1944 e se recusou a obedecer às ordens diretas de Hitler para destruir a cidade. As tropas de ocupação chegaram a colocar cargas explosivas nas pontes e monumentos. O general resistiu às ordens até a chegada das tropas americanas, 16 dias depois. Von Choltitz foi preso pelas tropas de ocupação e liberado em 1947. Tornou-se um estranho herói francês, por salvar seus maiores monumentos. O final do filme, após a libertação, rodado a cores, com uma apoteótica música de Jarre, é capaz de emocionar até um inglês.

Na segunda vez, já não tão adolescente, eu estava em Paris, após cumprir o obrigatório roteiro de visita aos monumentos salvos pelo Von Choltitz. Roteiro que pode apresentar partes pouco emocionantes, diga-se de passagem. Saindo da nada emocionante Torre Eiffel, hora do passeio pelo Sena a bordo de um aconchegante Bateau Mouche, com 1399 lugares. Cabe mais gente lá dentro do que na Île de la Cité. Dia lindo, rio que não fede, monumentos por todos os lados e a Amparo descrevendo tudo em inúmeras - quantas foram? - línguas. Amparo foi nossa recreacionista de turistas adultos. Bela, vestida em uniforme de motivos náuticos, como convinha, descreveu tudo, cantou e tentou salvar os turistas japoneses que caíam de bordo, sempre sorrindo. Finalmente, contou a história de Von Choltitz, ao som da música tema do filme de Clement. Então confesso, até a visão da insossa Torre Eiffel teve algum gosto. Tive de morder o lábio.

Hoje Paris arde em chamas, lentamente, iniciando pela periferia. Em Montfermeil, Seine-Saint-Denis e Clichy-sons-Bois, ardem carros todas as noites, queimados em protesto, pelos jovens das minorias raciais. Em algumas noites ardem mais, como naquelas de janeiro de 2006.

Nada que preocupe muito Marie, tomando banho de sol da primavera na margem esquerda do Sena, em Port de la Concorde, deitada de bruços sobre uma toalha. Nada adolescente, voltada para o rio, Marie tira a parte superior do biquíni. A cada Bateau Mouche que passa pela margem, Marie levantava-se para abanar, saudando os turistas com seus majestosos sinos badalando em sincronismo, para lá e para cá, aparentemente competindo com os sinos da Catedral de Notre Dame, não longe dali. Os sinos de Notre Dame tocaram poucas vezes, nos últimos dois séculos. Tocaram em 28 de agosto de 1944, comemorando a libertação de Paris. Os de Marie tocam diariamente, lá pelo meio-dia, se não dizer muito frio. Não chega a emocionar. Porém, impressiona!
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1 Comments:

At domingo, 27 setembro, 2009, Blogger Ana Lúcia Salles do Amaral said...

"Paris esá em chamas " foi o primeiro filme que assisti no cinema, aos 10 anos de idade. Antes, só ia a matinés. A mim causou uma impressão profunda, por eu ser muio sensível e naqueles dias estava tomando conhecimento, através de leituras, do que foi a II Guerra Mundial e o nazismo. Sem dúvida, um bom filme, com um elenco espetacular.

 

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