1.10.09

551 - Pâté de foie de chameau

Foto: Cristina Heuser

Pâté de foie de chameau

Paulo Heuser

Priscila joga pôquer. É noite de quinta-feira, noite da confraria das Madalenas. Ela e as demais confreiras reúnem-se na casa da Mercedes, única descasada, para tornarem os outros seis dias da semana menos miseráveis, psicologicamente falando. Elas esquecem-se dos maridos, filhos, sogras e de tudo mais que as cerca. Pedem pizza e comem com as mãos. Findo o jantar, jogarão rodadas e mais rodadas de carteado, até que o álcool e o sono as vençam. Odeiam cozinhar. Priscila só bebe às quintas, nada socialmente. Enxuga meia garrafa de uísque. Depois da terceira dose, bebe no bico, intercalando os goles com gargalhadas que fariam a sogra ter ataques de alguma doença de senhôras, assim mesmo, com acento. Ou, talvez, no assento. Algumas fumam charutos. As quintas são do diabo. Elas vêm de taxi, pois não encontrarão o caminho de volta. Lurdes senta-se ao lado de Priscila.

- Pri, como está o Nando?

- Igualzinho, hoje está naquela confraria de cozinheiros.

- O Mario tá querendo entrar.

- Não entendo os homens. Tem coisa mais besta do que se enfiar numa cozinha e passar toda a noite preparando papinha esquisita? Eu fujo da cozinha, ele espera toda a semana para vestir aquela roupinha branca e se meter no meio daquele monte de homem. Todos vestidos de branco, parecem pais-de-santo. Depois, dão comida, uns para os outros, e se auto-elogiam. A maioria daria um dedo por um filé à cavalo e arroz com feijão.

- Ah, mas ele aprende as receitas e, depois, prepara aquelas coisas deliciosas prá ti, em casa...

- Tô fora! Se ainda saísse algo comestível, como um espaguete, no capricho, mas só sai coisa estranha! Em vez de beberem o vinho, enfiam-no na panela. Chega a dar dó. Na quinta passada, o Nando pagou 40 contos por uma garrafa de vinho e a despejou dentro da gororoba que ninguém comeu. Ele trouxe aquela meleca para casa, pâté de foie de chameau. Já pensou, alguém moer fígado de dromedário?

- Nossa, Pri, vou tentar segurar o Mário. Ficarei em casa e farei comida para ele. Esta jogatina não é tão importante assim.

- Deixe, Lú. Eu descobri uma coisa. As meninas brincam de casinha quando pequenas. Os homens, depois de velhos.

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