Churrasco à Gaúcha (Parte II)
Churrasco à Gaúcha (Parte II)
A discussão, sobre o que é o churrasco autêntico, é interminável. Há até uma Lei Estadual, de No. 11.929, de 20 de Junho de 2003, que define o que é churrasco. Este é o único prato que pode ser preparado por quem não sabe cozinhar. Segundo a FAO, em 2002, 97,56% dos churrasqueiros eram homens (senão seriam churrasqueiras!). Destes, 91,13% não sabiam preparar nada além do churrasco. Os demais sabem preparar pão com alho e cebola no espeto. Conforme a lei, supracitada, basta colocar sal grosso e assar sobre brasas de carvão ou madeira. Até agora não consegui entender por que as mulheres, em geral, não sabem assar churrasco. Creio em um complô mudo, para não ferir o ego masculino. Elas apenas fingem que não sabem assar. Pode imaginar no que transformariam aquele ambiente sagrado? Manteriam a churrasqueira limpa. Trocariam o corno, dependurado na parede, por um quadro de flores e o cocho de madeira encardida pela travessa de aço. Lavariam as mãos, espetos e panos antes de utilizá-los. E o pior: temperariam a carne, com sal fino! Para o desespero do índio velho, a canha brava, com fumo em corda, daria lugar ao refrigerante light de cola, com limão e espumante Asti. A cerveja seria substituída pelo vinho tinto. Assim como há enochatos, em relação ao vinho, há os assadores chatos, em relação ao churrasco. Conhecem carne melhor do que o açougueiro. Utilizam facas que não podem ser lavadas – perdem o fio, degustam sal grosso e inventam estranhos cortes. Viram carnes ao avesso e adoram assá-las, por horas a fio, até que se desmanchem. Os paranaenses copiaram um antigo rolete, de tortura romana, e se especializaram em dissolver costelas inteiras. Os carvões, de acácia negra e de eucalipto, julgam coisa de amador. Exigem toras de Pau Trembaúva, dos dormentes da extinta ferrovia Madeira-Mamoré. Amam o ritual. Sobre o acendimento do fogo, escrevem livros. Os mais puristas exigem que as toras sejam incendiadas com restos da Chama Crioula de 1947, guardados numa pira particular. Admitem o uso de fósforos, em casos excepcionais. Acendedores artificiais, papel de jornais e álcool são heresia pura - dão gosto à carne. Nenhuma churrasqueira lhes agrada, constroem uma nova, sob medida, para cada churrasco. Estudam técnicas complicadas para salgar a carne. Uns salgam 48 horas antes. Outros, dois dias depois. Ao degustar a carne, conseguem identificar a raça, o sexo, a idade, o pasto, o veterinário, o açougueiro e a origem do sal ingerido pelo defunto. Salada, nem pensar, coisa para ruminantes. Não ligo muito, posso estar na minha churrasqueira, salgando a minha carne, com o meu sal, assando como bem entendo, observado pela minha cadela!
A discussão, sobre o que é o churrasco autêntico, é interminável. Há até uma Lei Estadual, de No. 11.929, de 20 de Junho de 2003, que define o que é churrasco. Este é o único prato que pode ser preparado por quem não sabe cozinhar. Segundo a FAO, em 2002, 97,56% dos churrasqueiros eram homens (senão seriam churrasqueiras!). Destes, 91,13% não sabiam preparar nada além do churrasco. Os demais sabem preparar pão com alho e cebola no espeto. Conforme a lei, supracitada, basta colocar sal grosso e assar sobre brasas de carvão ou madeira. Até agora não consegui entender por que as mulheres, em geral, não sabem assar churrasco. Creio em um complô mudo, para não ferir o ego masculino. Elas apenas fingem que não sabem assar. Pode imaginar no que transformariam aquele ambiente sagrado? Manteriam a churrasqueira limpa. Trocariam o corno, dependurado na parede, por um quadro de flores e o cocho de madeira encardida pela travessa de aço. Lavariam as mãos, espetos e panos antes de utilizá-los. E o pior: temperariam a carne, com sal fino! Para o desespero do índio velho, a canha brava, com fumo em corda, daria lugar ao refrigerante light de cola, com limão e espumante Asti. A cerveja seria substituída pelo vinho tinto. Assim como há enochatos, em relação ao vinho, há os assadores chatos, em relação ao churrasco. Conhecem carne melhor do que o açougueiro. Utilizam facas que não podem ser lavadas – perdem o fio, degustam sal grosso e inventam estranhos cortes. Viram carnes ao avesso e adoram assá-las, por horas a fio, até que se desmanchem. Os paranaenses copiaram um antigo rolete, de tortura romana, e se especializaram em dissolver costelas inteiras. Os carvões, de acácia negra e de eucalipto, julgam coisa de amador. Exigem toras de Pau Trembaúva, dos dormentes da extinta ferrovia Madeira-Mamoré. Amam o ritual. Sobre o acendimento do fogo, escrevem livros. Os mais puristas exigem que as toras sejam incendiadas com restos da Chama Crioula de 1947, guardados numa pira particular. Admitem o uso de fósforos, em casos excepcionais. Acendedores artificiais, papel de jornais e álcool são heresia pura - dão gosto à carne. Nenhuma churrasqueira lhes agrada, constroem uma nova, sob medida, para cada churrasco. Estudam técnicas complicadas para salgar a carne. Uns salgam 48 horas antes. Outros, dois dias depois. Ao degustar a carne, conseguem identificar a raça, o sexo, a idade, o pasto, o veterinário, o açougueiro e a origem do sal ingerido pelo defunto. Salada, nem pensar, coisa para ruminantes. Não ligo muito, posso estar na minha churrasqueira, salgando a minha carne, com o meu sal, assando como bem entendo, observado pela minha cadela!
Paulo Roberto Heuser
2 Comments:
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