416 - Prazerosamente congelados
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Prazerosamente congelados
Por Paulo Heuser
A racionalidade do ser humano é posta à prova em cada mudança de estação. Sabemos que, quando o inverno chega, esfria. Sempre foi assim. Pode mudar no futuro, mas o clima esfria no inverno e esquenta no verão. Contudo, todos parecem surpreendidos pelo frio. Quando os termômetros baixam dos 15 graus Celsius, começa a choradeira, como se os termômetros marcassem 15 Kelvin (-258 Cº). Cada inverno parece mais frio que os anteriores. Pelo menos, é o que dizem.
Num ponto parece que há unanimidade, quando o assunto é clima: todos parecem querer fugir do frio, na direção do calor. Os brasileiros sonham em morar no Nordeste, depois da aposentadoria. Querem morar onde há muito sol e calor. Deixarão o fio e a umidade para trás. Secarão o reumatismo ao sol.
Os europeus, que sofrem muito mais com o frio, fazem a mesma coisa, fogem do frio. Quem lucra com isso, são os países do Mediterrâneo. A cidade litorânea de Rimini, na Emiglia-Romana, costa adriática da Itália, é conhecida como “forno de microondas dos alemães”, que correm para lá e ficam cozinhando ao sol. As longas praias de areia, bem mais baratas do que as do outro lado da bota, na Costa Ligure do Mar Tirreno, enchem-se de alvos alemães, que não vêem a hora de se transformarem em algo com cor de lagosta cozida. Com bolhas, muitas bolhas. Faz bem, para o câncer de pele. Eles deixam para trás suas casas bolorentas e mal ventiladas, lagarteiam de dia e fazem farra à noite.
Até aqui, tudo parece bem racional, tirando a exposição ao sol de verão. O que mais me espanta, aqui, é a migração para a Serra, durante o auge do inverno, daqueles que se queixam tanto do frio. Um tanto de frio, aqui é ruim, lá é pouco. Vão curtir um friozinho, como dizem. É exatamente aí que começa a irracionalidade. Se sonham tanto com o calor, por que vão para o frio? Alguns dizem que vão pela sensação do aconchego proporcionado pelo frio. Procuram temperaturas extremamente baixas. Qualquer coisa acima de zero leva à frustração. Dançam de alegria, quando neva ou chove gelo. Inclusive aqueles que chegam nos ônibus de farofeiros, trajando camisa regata, bermudas e chapéu sombreiro. Basta que os informativos meteorológicos anunciem baixas temperaturas na Serra, para que os hotéis da região lotem.
Os restaurantes que servem pratos fumegantes, ao lado das lareiras, também fumegantes, são os preferidos pelos que querem curtir o frio. Os jantares estendem-se à espera da neve, que eventualmente cai. Tudo envolto pela atmosfera romântica, em meio à iluminação em tons quentes. Entendo o conceito, e concordo que é muito prazeroso passar bons momentos naquele clima, desde que ele fique do lado de fora.
O Bira Louco entende menos ainda, por que alguém pagaria para ser levado a um lugar ainda mais frio. Andando pela praça, meio torto, de sandálias havaianas amarelas e casaco de tricô colorido, ele tem certeza de que trocaria sua marquise daqui por alguma de Fortaleza, Natal, ou Rimini, se tivesse algum dinheiro. O que ele não sabe, é que aqueles que se divertem com o frio são os que podem pagar por ele. De graça, só sofrimento!
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