467 - Um novo modelo mercadológico-eleitoral
Verona. Foto: Paulo Heuser
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Um novo modelo mercadológico-eleitoral
Por Paulo Heuser
As empresas arrendadoras de bens costumam registrar a parte imutável dos contratos de arrendamento mercantil (leasing) nos cartórios de notas. Essa prática permite a confecção de contratos bastante enxutos, pois o que é invariável apenas é referenciado na parte específica de cada negócio. Lembrei-me disso ao assistir ao programa eleitoral obrigatório.
Todos os candidatos a vereador repetem as mesmas coisas. Todos se posicionam contra a corrupção e a favor da segurança, da saúde e da educação. O problema é que lhes falta tempo após a ladainha imutável. Um partido nanico já adotou o jogral como forma de difundir suas idéias exclusivas. Cada candidato diz uma palavra. Lembra um pouco os jograis da Dona Camila, no jardim de infância. Só que no lugar dos versos há apenas uma palavra para cada candidato. Porém, ainda assim falta-lhes tempo, pois quando eles terminam a frase padrão, o tempo acabou.
A relação entre eleito e eleitor não deixa de ser um contrato, mesmo que celebrado de forma tão secreta. O termo “compra de votos” não está muito correto, pois o prazo é fixo: quatro anos. Mais correto seria chamá-lo de arrendamento mercantil do voto, pois há cláusula que permite renová-lo por mais períodos de quatro anos. Juntando nada com coisa nenhuma se poderia criar um novo modelo de propaganda eleitoral obrigatória, com evidentes vantagens mercadológico-eleitorais. Pactuadas e registradas as cláusulas pétreas da eterna ladainha, os candidatos poderiam exercer toda sua criatividade. Aqueles preciosos segundos poderiam servir para divulgar as propostas que diferenciariam aquele candidato de todos os outros.
Da Itália vêm belos exemplos da criatividade legislativa municipal. Proibiram o uso de tamancos na paradisíaca ilha de Capri. Nem pense em fazer castelos de areia nas praias de Eraclea. Dá multa. O pessoal deu asas às leis em Verona. Os flanelinhas veroneses são multados e perdem a féria. Os clientes das prostitutas da terra dos Montecchi e Capuleti levam pesadas multas. A sorte do Romeu de Shakespeare é que aquela Julieta era moça de família. A tragédia contemporânea será protagonizada pelo flanelinha descamisado Romeu que namora a prostituta Julieta que come sandubas junto aos monumentos históricos de Verona. Sim, comer junto aos monumentos e andar sem camisa em Verona também é proibido. Num recente episódio, os pais de um menino de quatro anos foram multados porque ele comia um sanduíche em área considerada histórica. Esse episódio gerou um comentário interessante por parte de um cidadão veronês: “boh, multare un bambino perché mangia un panino mi pare un’emerita cagata degna di un minorato mentale.. ma se la legge è cosi.. allora il minorato mentale non è solo chi la applica ma anche chi l’há fatta.” – “não sei, multar um menino porque come um sanduíche parece uma, digamos assim, mancada digna de um retardado mental.. mas se a lei é assim.. então o retardado mental não é apenas quem a aplica mas também quem a fez.”
Ao leste da Itália, na Romênia, há um mendigo de Bucareste que já acumula mais de um milhão de dólares em multas. Ele é multado diariamente por mendicância e perturbação da ordem. Será que ele hoje pede esmolas para tentar pagar as multas de ontem?
Fico a sonhar com as propostas que poderiam surgir no horário eleitoral obrigatório, se os candidatos não fossem obrigados a repetir aquela seqüência enfadonha de corrupção, educação, saúde e segurança. Poderiam propor a limitação do nível de ruído gerado pelos pernilongos, ou, quem sabe, um horário limitado para o canto dos sabiás.
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Marcadores: Bucareste, candidato, eleições municipais, horário eleitoral, Itália, Romênia, vereador, Verona
1 Comments:
Um horário determinado para o canto dos sabiás seria ótimo agora que é primavera, e tem passarinho começando a cantar às três ou quatro da madruga.
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