25.9.07

Ele voltou


Foto: Paulo Heuser
Ele voltou

Por Paulo Heuser


As frutas sazonais tinham outro sabor. Bergamotas, laranjas, morangos, uvas, melancias, todas tinham época. Foi-se a época em que havia época. As temporadas estendem-se até não haver mais interrupção. Comem-se uvas e morango durante todo o ano. As bergamotas ainda resistem à perenidade. As verdadeiras caducam. A disponibilidade de quase que qualquer tipo de frutas, o ano todo, tirou a graça de comê-las no início das temporadas. Os primeiros morangos eram vistos como tesouros. Encontráveis em cada esquina de avenida, durante meses a fio, perderam seu encanto. Aliás, a grande oferta tira o valor de qualquer coisa. Enjoamos delas.

Quem me incomoda mesmo, pelo excesso de disponibilidade, é o Papai Noel. Ouvia-se falar nele no Advento. Antes disso, e depois, só no sonho. E naquelas frases que os adultos usavam para ameaçar as crianças que já não acreditavam nele. Pois o Natal voltou, em pleno setembro. E veio com as tradicionais previsões de recordes de vendas. Junto com ele virão eternas músicas que encherão nossos ouvidos, até a exaustão. Dos mercados aos celulares, Jingle Bells e Noite Feliz ecoarão por toda parte. O sino pequenino triturará os nervos de todos, em Belém e aqui. Ontem ouvi o papo de duas pessoas que falavam da necessidade de organizarem a primeira festa de Natal da temporada, com amigos secretos, ocultos e tudo mais. A primeira, bem entendido.

Talvez seja a hora de inovar. Li um artigo que anunciava as cores do próximo Natal. Tons cítricos. Quem sabe teremos Papais Noéis vestidos de verde limão? É uma boa forma para se obrigar os entusiastas dos bonecos de sacada a trocá-los por novos. Afinal, Papais Noéis vestidos de vermelho estarão definitivamente fora de moda. Coisas de outros Natais. Poderão até guardá-los, para uso futuro, pois a moda volta. Em 2013 poderão voltar, após os amarelos, azuis e lilases. Talvez barbeados e calvos. Nada de barriga, também. Os Papais Noéis serão sarados e trocarão aqueles antiquados óculos de aros redondos pelos novos modelos italianos com hastes retas, após as orelhas. Moda é moda, mas que parecem quitandeiros com lápis em cada orelha, isso parecem.

As árvores de Natal da nova estação serão despojadas, evitando-se o uso do plástico. Nas roupas dos festeiros aparecerão o cinza e o branco. Isso me dá idéias. Sabe-se que as lojas de um e 99 compram estoques de elementos de decoração em verde e vermelho, cujos excedentes são vendidos antes do Carnaval. O que era guirlanda de Natal vira adereço de Carnaval. È uma reciclagem alegórica. Daí talvez venha a idéia dos tons cítricos. Têm mais a ver com as festas pagãs. Como o Papai Noel já é elemento pagão mesmo, poderíamos unificá-lo com os pierrôs. Às canções de Natal juntar-se-iam quadrilhas de rodeio, axé dance, e outras manifestações regionais. A festa começaria em setembro e continuaria até março. Ou melhor, continuaria pelo resto do ano, com as micaretas. Os Papais Noéis de rua poderiam adotar trajes mais arejados, como bermudas e camisetas, ensinando performances de mararena às criancinhas que prometeram estudar com afinco. No fundo, Noeletes fariam as vezes de dançarinas de corpo de dança, executando a dança do siri. Em meio às palmeiras artificiais decoradas com cocos coloridos.

O coelho da Páscoa? Por que não? Adentraremos abril! O Papai Noel tradicional combina bem com a Oktoberfest. Basta vesti-lo de bávaro, mesmo que seja com um chapéu verde-limão. Perenizamos o clima de festa. Qual das festas? Ora, todas, pois realmente não dá para se engolir um Papai Noel em setembro. Nem em outubro.
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