A invasão do mendigo
Foto: Paulo Heuser
- Que foi, bem? – perguntou-lhe Rita, em meio à escuridão.
- Não sei, bem. Acordei com a sensação de haver ouvido em estrondo.
- Pensando bem, meu amor, também tive essa impressão. – disse ela, enquanto sentava-se na cama. – Vou beber água e darei uma checada em tudo. Pode ter sido o vento, fechando uma janela.
Exatos treze segundos depois, enfiava-se debaixo do lençol, cutucando o novamente adormecido Pedro. Cochichava quase aos gritos:
- Pedro, tem um mendigo pavoroso na sala!
Pedro acordou dando socos no ar, naquele estado em que consciente e inconsciente travam imensa batalha pelo controle da mente.
- Umpf! Gasph! O que foi?
- Pedro, tem um mendigo pavoroso na sala!
- Você sonhou, meu bem. Torne a dormir...
- Vá lá e olhe você mesmo! – cochichou ela, novamente aos berros.
- Ok, calma. Se for para tranqüilizá-la, eu vou.
Novos treze segundos decorreram, até que ele a encontrou sob o lençol da cama. Foi a vez dele, cochichar em pânico:
- Tem mesmo, bem. Eu vi!
- E agora, bem?
- Dê-me o telefone!
O teclado iluminado ajudou Pedro a discar o número de emergência, na memória nove.
Após muitos tututús de ocupado, uma voz distante atendeu:
- Pois não?
- Socorro, há um mendigo pavoroso na minha sala! Mandem alguém, urgente!
- O que ele está fazendo aí? - disse a voz calma.
- Não sei, estou escondido no meu quarto!
- O senhor deixou que ele entrasse?
- Não, não sei como ele entrou, pois o alarme não disparou e os cachorros não latiram!
- Entendo, senhor. Procure manter a calma e espere a chegada da viatura que chegara aí em, vejamos, 58 minutos, se não ocorrer outro chamado mais urgente.
- O que pode ser mais urgente do que isso?
- Bem, senhor, se o mendigo pavoroso estivesse com o senhor, no seu quarto, poderia ser bem pior.
Pedro aproveitou a espera para rastejar até o quarto do Pedrinho, ao lado. Pegou o menino adormecido no colo e retornou silenciosamente ao seu quarto. Passaram a ser três sob os lençóis, dois adultos apavorados e um menino dormindo.
O aparente silêncio foi rompido pela algazarra dos cães. O giroflex da viatura provocava efeitos luminosos de azul e vermelho. A porta da frente veio a baixo, pedalada pelo agente Rambo, que de pronto metralhou o criado mudo onde penduravam capas e chapéus.
- Chefe, estamos no local da invasão de domicílio. Encontramos um sujeito que diz ser o Papai Noel. Parecido, até que ele é. Vamos levá-lo ao plantão.
Pedrinho entrou na sala, acordado pelo barulho da confusão, e viu aquele velho parado no meio da sala, com as mãos para cima. Deu uma olhada dentro do saco que jazia ao lado do homem e sentenciou:
- É fajuto, é fajuto!
- Como você sabe? – perguntou-lhe o agente Rambo.
- Ora, aí só tem bonecas, bolas e carrinhos de brinquedo. Qualquer babaca sabe que as crianças não brincam mais!
A invasão do mendigo
Por Paulo Heuser
Pedro acordou sobressaltado. Acordou com a sensação de ter ouvido um ruído estranho, como um baque surdo. – Droga! – disse para si mesmo, já que Rita dormia em sono tão profundo como a Fossa das Filipinas. Ele esquecera-se novamente da garrafa pet de guaraná no frízer? Lembrou-se da última vez em que ouvira os ecos daquele baque surdo. Um petardo de guaraná explodiu, ao congelar, abriu a porta do frízer e espalhou meleca por todos os lados. Meio a contragosto, levantou-se para verificar os novos estragos. Foi com certa surpresa que parou diante do frízer fechado. Abriu a porta com cuidado. Nada de guaraná, nem inteiro, nem explodido. Acreditando ter sonhado com algo que provocara aquele ruído, retornou para a cama.
Por Paulo Heuser
Pedro acordou sobressaltado. Acordou com a sensação de ter ouvido um ruído estranho, como um baque surdo. – Droga! – disse para si mesmo, já que Rita dormia em sono tão profundo como a Fossa das Filipinas. Ele esquecera-se novamente da garrafa pet de guaraná no frízer? Lembrou-se da última vez em que ouvira os ecos daquele baque surdo. Um petardo de guaraná explodiu, ao congelar, abriu a porta do frízer e espalhou meleca por todos os lados. Meio a contragosto, levantou-se para verificar os novos estragos. Foi com certa surpresa que parou diante do frízer fechado. Abriu a porta com cuidado. Nada de guaraná, nem inteiro, nem explodido. Acreditando ter sonhado com algo que provocara aquele ruído, retornou para a cama.
- Que foi, bem? – perguntou-lhe Rita, em meio à escuridão.
- Não sei, bem. Acordei com a sensação de haver ouvido em estrondo.
- Pensando bem, meu amor, também tive essa impressão. – disse ela, enquanto sentava-se na cama. – Vou beber água e darei uma checada em tudo. Pode ter sido o vento, fechando uma janela.
Exatos treze segundos depois, enfiava-se debaixo do lençol, cutucando o novamente adormecido Pedro. Cochichava quase aos gritos:
- Pedro, tem um mendigo pavoroso na sala!
Pedro acordou dando socos no ar, naquele estado em que consciente e inconsciente travam imensa batalha pelo controle da mente.
- Umpf! Gasph! O que foi?
- Pedro, tem um mendigo pavoroso na sala!
- Você sonhou, meu bem. Torne a dormir...
- Vá lá e olhe você mesmo! – cochichou ela, novamente aos berros.
- Ok, calma. Se for para tranqüilizá-la, eu vou.
Novos treze segundos decorreram, até que ele a encontrou sob o lençol da cama. Foi a vez dele, cochichar em pânico:
- Tem mesmo, bem. Eu vi!
- E agora, bem?
- Dê-me o telefone!
O teclado iluminado ajudou Pedro a discar o número de emergência, na memória nove.
Após muitos tututús de ocupado, uma voz distante atendeu:
- Pois não?
- Socorro, há um mendigo pavoroso na minha sala! Mandem alguém, urgente!
- O que ele está fazendo aí? - disse a voz calma.
- Não sei, estou escondido no meu quarto!
- O senhor deixou que ele entrasse?
- Não, não sei como ele entrou, pois o alarme não disparou e os cachorros não latiram!
- Entendo, senhor. Procure manter a calma e espere a chegada da viatura que chegara aí em, vejamos, 58 minutos, se não ocorrer outro chamado mais urgente.
- O que pode ser mais urgente do que isso?
- Bem, senhor, se o mendigo pavoroso estivesse com o senhor, no seu quarto, poderia ser bem pior.
Pedro aproveitou a espera para rastejar até o quarto do Pedrinho, ao lado. Pegou o menino adormecido no colo e retornou silenciosamente ao seu quarto. Passaram a ser três sob os lençóis, dois adultos apavorados e um menino dormindo.
O aparente silêncio foi rompido pela algazarra dos cães. O giroflex da viatura provocava efeitos luminosos de azul e vermelho. A porta da frente veio a baixo, pedalada pelo agente Rambo, que de pronto metralhou o criado mudo onde penduravam capas e chapéus.
- Chefe, estamos no local da invasão de domicílio. Encontramos um sujeito que diz ser o Papai Noel. Parecido, até que ele é. Vamos levá-lo ao plantão.
Pedrinho entrou na sala, acordado pelo barulho da confusão, e viu aquele velho parado no meio da sala, com as mãos para cima. Deu uma olhada dentro do saco que jazia ao lado do homem e sentenciou:
- É fajuto, é fajuto!
- Como você sabe? – perguntou-lhe o agente Rambo.
- Ora, aí só tem bonecas, bolas e carrinhos de brinquedo. Qualquer babaca sabe que as crianças não brincam mais!
Marcadores: brinquedo, invasão de domicílio, metralhadora, natal, papai noel, presente, rambo
4 Comments:
Ótimo este texto. Non sense e riqueza hermenêutica.
Certo, Zé. Vou entender isso como um elogio :)
É um elogio. Começa com "Ótimo este texto". :))
Mas ahhh :))
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