27.5.08

404 - "p/0,31 imp."


Lago Baikal. Foto: wikipedia
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“p/0,31 imp.”


Por Paulo Heuser



O característico som de duas marteladas anunciava a chegada de um torpedo - frase que teria significado bastante diverso, há 20 anos. Todos se poriam a correr, provavelmente. O torpedo do celular abriu um novo meio de comunicação entre os provedores de serviços e as suas vítimas, como eu. Eu sequer sabia da existência de algo chamado Yavox. De repente, descobri ser um cliente involuntário dele, também conhecido como vítima.

A mensagem avisava que, como eu havia solicitado novidades, participaria de uma promoção “p/0,31 imp.”. Coisa auto-explicativa. O que seria “p/0,31 imp.”? Seria impressão? Ou então, impulso de esganar quem me enviou aquilo? Antevendo prejuízo - pela presença do “p/0,31” - liguei para o telefone informado na mensagem, para cancelamento daquilo que não solicitei. Prontamente a Embratel me avisou que o número 4005-1122 não existia. Havia um número para o qual poderia enviar um torpedo, informando CANC, para cancelamento do serviço que não solicitei. No desespero, enviei, para imediatamente receber outro torpedo, esclarecendo que eu deveria informar o serviço que eu queria cancelar. Boa pergunta! O que mesmo eu não contratara? Desisti da comunicação inteligente, com a tal de Yavox, e apelei para a operadora do celular.

Maravilha! Não esperei nem um minuto, enquanto ouvia as explicações de praxe. Teclei nove, fui atendido, e uma operadora (humana!) muito gentil ouviu minha história triste, pesquisou a solução e me orientou sobre o cancelamento do serviço. Recebi um protocolo de atendimento 2008cobraselagartos e agradeci, desligando e partindo para efetuar um CANC do “p/0,31 imp.”, antes que o prejuízo se mostrasse maior. De nada serviu o argumento de que eu não contratara o “p/0,31 imp.”. Uma vez ativado, era como beiço de quem comeu mocotó – grudava! Tentei enviar CANCs para o número 49094, conforme instruído, de todos os jeitos, mas o “p/0,31 imp.” permanecia lá, inabalável. Liguei novamente para a operadora.

Só faltou a atendente chorar comigo. Ela também não fazia a mínima idéia de como remover o grude do “p/0,31 imp.”. Recebi novo protocolo 2008cobraselagartos e fui instruído a aguardar a ligação de um engenheiro que deveria desgrudar o “p/0,31 imp.”. O engenheiro não ligou. Sabendo que eu não conseguiria dormir, pensando no “p/0,31 imp.”, apelei para o palavrão. Funcionou! Recebi um torpedo informando sobre a minha condição de ex-assinante daquilo que nunca assinei. Aliviado, me recompus. Chegou a hora de correr atrás do prejuízo causado pelos 17 torpedos enviados para cancelar o “p/0,31 imp.”. Fui buscar auxílio no sítio da tal de Yavox. O navegador do micro ficou pensando, durante algum tempo, para me informar que estava sem conexão com a Internet. Tentei novamente. Nada. Tentei o sítio da operadora de celular. Nada. Liguei uma coisa à outra, e veio o medo. Um medo denso, profundo, mudo e ardente. Eu nem sabia que um medo podia ser tudo isso, ao mesmo tempo. Ao cancelar o “p/0,31 imp.”, eu provavelmente cancelara algo mais, como minha conexão ao abominável mundo novo.

Fiquei sentado, pensando no que fazer. Da cozinha vinha um grito: “- Paiêêê!!! A geladeira não abre!!!”. Céus, a coisa era pior do que parecia inicialmente. Bom, pelo menos a televisão ainda funcionava. Tanto funcionava, que ainda consegui ouvir aquele infernal comercial que dizia, repetitivamente, que na Sibéria não tem nada disso. Ouvi-lo, me deu novo ânimo. Se não havia nada disso lá, tampouco havia “p/0,31 imp.”! Peguei o telefone, para ligar para a Aeroflot e comprar meu bilhete para a Sibéria. Estava mudo.

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